Qual Chianti?

As colinas centrais na região da Toscana, na Itália, escondem verdadeiras preciosidades vinícolas. Desta região são conhecidos e apreciados no mundo todo os vinhos feitos com a Brunello, da região de Montalcino, uma variação clonal da uva Sangiovese – a mais plantada da Itália. Há, no entanto, um outro tipo de vinho, nesta mesma região, cujo prestígio vem subindo ano após ano. São os vinhos da região montanhosa de Chianti (a grosso modo, área geográfica entre Florença e Siena). Para os apreciadores de vinho é a chance de beber um bom vinho desta região a um preço bem mais acessível que a grande maioria dos Brunellos di Montalcino. Mas vamos tentar entender melhor o que são os Chiantis, pois há diferenças significativas entre eles.

A primeira demarcação de área da região de Chianti data do século XVIII, especificamente em 1716, pelo Grão Duque de Medici Cosimo III. Em 1932 esta área foi ampliada e hoje esta zona vinícola é conhecida como Chianti Clássico. É neste ano que o sufixo “Clássico” é adicionado para distinguir a produção de Chiantis delimitados nesta área, dos Chiantis produzidos fora deste território.
Em 1967 o governo italiano criou a Chianti Denominação de Origem Controlada (DOC), onde estava incluída a subzona Chianti Clássico. É neste período que esta região vinícola começa a passar por transformações profundas. Em meados da década de 60 e início da de 70 há um grande aumento na demanda de vinhos desta região. A superprodução à época valoriza mais a quantidade do que a qualidade dos vinhos. As regras de produção criadas na DOC são desrespeitadas – ou modificadas sem critério razoáveis – por alguns produtores, comprometendo a qualidade dos vinhos. Resultado: a imagem e a reputação dos vinhos de Chiantis tornaram-se as piores possíveis. É em meio a este conflito de interesses que alguns produtores rebelam-se contra as regras vigentes na DOC Chianti e dão início a produção dos vinhos que ficaram conhecidos como supertoscanos.

Na década de 80 a região de Chianti foi elevada a Denominação de Origem Controlada e Garantida (DOCG), que é a mais alta distinção de vinhos de qualidade na Itália. Em 1984 a subzona Chianti Clássico cria a sua própria DOCG, não fazendo mais parte da região Chianti DOCG. É importante ressaltar que desde a década de 70, principalmente após o sucesso no mercado mundial dos vinhos supertoscanos, uma série de novas regras foram sendo criados na região de Chianti, tal como a autorização da utilização de uvas de origem francesa na produção dos vinhos – ainda que a Sangiovese prevaleça com no mínimo 70% na composição.

Chianti DOCG

A denominação Chianti DOCG pode ser usada por 7 sub-regiões de onde as uvas são provenientes e vinificadas. São elas::
Rufina
Colli Fiorentini
Colli Aretini
Colli Senesi
Colline Pisane
Montalbano
Montespertoli
Fora destas regiões os vinhos são denominados somente Chianti (ou Chianti Clássico DOCG), sem nenhuma designação adicional. Estes vinhos são, segundo os especialistas, aqueles que estão na base da pirâmide de todos os vinhos Chiantis. Frequentemente são os Chiantis mais baratos.
Mas mesmo dentro das sete sub-regiões existem regras diferentes entre cada uma delas. A sub-região Colli Senesi, por exemplo, determina que a uva Sangiovese tenha, ao menos, 75% na composição do vinho. Nas outras sub-regiões a composição é de 70%. Há outras diferenças sobre composição de outras uvas na produção do vinho e também no período mínimo de maturação em barricas, entre outras coisas.
Certamente algumas dessas regras influenciam a qualidade final dos vinhos produzidos em cada uma dessas regiões. Mas não é só isto. A localização de cada uma destas regiões, a qualidade do produtor, o microclima em cada uma destas áreas faz com que a uva Sangiovese, que é a base para todos estes vinhos, seja capaz de mostrar-se sob as mais diversas faces.
Os vinhos das regiões de Ruffina e Colli Senesi são frequentemente os vinhos mais bem posicionados pela crítica especializada. Os Chiantis de Ruffina tendem a envelhecer muito bem. Sofrem influência direta dos ventos frios dos Apeninos e das vinhas localizadas em altitude. Isso faz com a Sangiovese tenha um maior tempo de amadurecimento. Estes vinhos, frequentemente, demonstram uma acidez marcante. Para alguns, são os Chantis que mais rivalizam com os Chiantis Clássicos.
Já a região Colli Senesi fica totalmente dentro da província de Siena. É comum os produtores de Colli Senesi utilizarem uvas locais como a Canaiolo Nero, Colorino e a Ciliegiolo parte para “domar” os taninos da Sangiovese, parte para aumentar a gama de aromas e cores dos vinhos. É também permitido o uso de Cabernet Sauvignon e Merlot, cujo limite na composição do vinho é de no máximo 10%.

Chianti Clássico DOCG
Os vinhos produzidos na região de Chianti Clássico são considerados a elite dos Chiantis. Seu território é basicamente a delimitação da área de 1716, feita pelo Grão Duque de Médici (houve acréscimo de área na década de 30).
O Chianti Clássico tem uma facilidade em ser reconhecido até mesmo por leigos: toda garrafa possui o gallo nero (galo negro) em suas garrafas. É o símbolo histórico da antiga Liga Militar de Chianti. Diz a lenda que o comportamento de um galo negro foi fundamental para resolver uma disputa fronteiriça entre Florença e Siena, ainda no período medieval. Graças ao galo, a República de Florença prevaleceu na disputa e aumentou suas fronteiras até a região de Fonterutoli.
A composição de uvas de um Chianti Clássico tem a predominância da Sangiovese em ao menos 80%. Aqui, assim como em Colli Senesi, uvas nativas como a Canaiolo Nero e a Colorino são autorizadas. O mesmo vale para as internacionais Merlot e Cabernet Sauvignon (limite de 10%).
Mesmo entre os Chiantis Clássicos há diferenças significativas entre eles. Desde 2013 há três tipos possíveis: Chianti Clássico Annata, Chianti Clássico Riserva e Chianti Clássico Gran Selezione. Estes últimos são considerados os melhores Chiantis Clássicos. É o topo da pirâmide entre todos os Chiantis.
Mas o que faz dos Gran Selezione os melhores vinhos de Chianti? Para um Chianti ser rotulado como Gran Selezione é necessário cumprir uma série de requisitos. As uvas, por exemplo, não podem vir de qualquer vinhedo. Elas devem ser provenientes do melhor vinhedo da propriedade e cultivadas sob regras restritas. Outro fator importante é o envelhecimento mínimo de 30 meses, sendo ao menos 3 meses em garrafa. Além disso, uma comissão de degustação avalia se as características químicas e organolépticas são adequadas para um vinho de alta qualidade. São vinhos de ótima estrutura, persistente e muito equilibrado.
Já os vinhos Riserva e os Annatas são, respectivamente, o meio e a base da pirâmide entre os Chiantis Clássicos. Para um Chianti ser rotulado como Riserva ele também necessita de um envelhecimento mínimo de 24 meses – ao menos 3 meses em garrafa.
Como pudemos notar, são muitos os estilos de Chiantis no mercado do vinho. Então da próxima vez que lhe oferecerem uma taça ou garrafa de vinho desta região, talvez seja prudente perguntar: qual Chianti?